terça-feira, 16 de junho de 2009

Adultério

Ser adultero pode ser considerado um desvio da norma dentro das regras do casamento, não um comportamento desviante no sentido psicológico do termo.

Adultério, numa leitura de dicionário quer dizer literalmente na cama de outro(a) . Designa a prática da infidelidade conjugal que com o tempo se estendeu ao sentido de modificar de forma fraudulenta ou falsificar e ao léxico do verbo "adulterar".
Quer isto dizer que a palavra adultério se contextualiza em 2 esferas de valores: o jurídico, no âmbito da instituição casamento e o afectivo ou emotivo no campo das expectativas «defraudadas» no conjugue ou parceiro de relação, quando sente falsificada a essência do contrato relacional estabelecido.

No âmbito jurídico, o adultério é o acto de se relacionar com terceiro na vigência do casamento e é considerado uma grave violação dos deveres conjugais por quase todas as civilizações de quase toda a história, sendo que algumas sociedades puniam gravemente o cônjuge adúltero e/ou a pessoa com quem praticava o acto, sendo ambos passíveis de morte.

Houve razões de ordem patrimonial para, nas sociedades patriarcais, validar o casamento monogâmico e punir o adultério (sobretudo feminino) no contexto de garantir que os filhos nascidos do casamento eram filhos do marido e que os bens eram transmitidos por via paterna.

Historicamente a prática de adultério foi sempre considerada criminalmente mais grave quando praticado pela mulher. Hoje em dia, embora tal discriminação não exista nas leis dos países ocidentais, ou tenha perdido a sua eficácia sociológica, a mentalidade dominante considera-a de forma distinta de acordo com o género da pessoa adúltera.

A um homem adúltero é comum uma desculpabilização e compreensão do fenómeno e até mesmo alguma admiração pela sua masculinidade expressa na multiplicidade dos seus relacionamentos. Em certos meios é até sinal de estatuto social e económico.

Em contrapartida a uma mulher adúltera, independentemente das possíveis causas, um juízo de valor sobre o seu carácter e honestidade está quase sempre presente e nada abonatório a seu favor.

È indiscutível uma alteração conceptual no domínio legislativo, dando voz aos avanços ideológicos e sociais que consideram a igualdade de género entre homens e mulheres. Já nos quotidianos vivenciados por todos nós nem sempre se sente uma atmosfera de verdadeira igualdade, nem mesmo por parte das mulheres teoricamente beneficiadas por essa nova era de igualdade. O tempo da lei é, neste caso claramente mais à frente do que o tempo social. È a lei a ajudar a mudar as mentalidades e não em consonância com elas.

Nos países ocidentais o adultério ainda se constitui como causa suficiente para o divórcio. Porém, os relacionamentos com terceiros, são cada vez mais aceites, não só para um dos elementos do casal, mas também para os dois, como o demonstram as práticas cada vez mais assumidas pública e socialmente de swing (troca de casais) e outras similares.

Analisemos um caso prático. A obra literária de Gustave Flaubert, representa como o adultério era um assunto “tabu” e completamente punido por lei. Escrito em pleno século XIX, 1857, resultou num escândalo que levou o autor a julgamento pelo tratamento cru que deu ao tema adultério, juntamente com a crítica ao clero e à burguesia. O autor defendeu-se declarando que se inspirou na sua própria pessoa, mas foi acusado de ofensa à moral e à religião. A Sexta Corte Correccional do Tribunal do Sena absolveu Flaubert, mas os mais extremistas não o perdoaram pela sua abordagem dita tenebrosa do tema.

O livro conta a história de Ema Bovary, uma mulher casada com um médico, que se sente infeliz no seu casamento. Era fortemente influenciada pelos romances de Walter Scott, e como não tem a atenção que deseja do marido, pessoa muito pacata e entediante, envolve-se com amantes que acabam por a deixar. Ao envolver-se com outros homens perde os seus limites e endivida-se, dominada pelo consumismo. Ao perder mais um amante e a ver a sua vida no fundo do poço, completamente endividada toma arsénico e morre.

A evolução natural do casamento ao longo da história tendeu a dar cada vez menos valor ao contrato económico e de conveniência para valorizar o contrato de afectos.

Neste novo contexto a esfera das relações ganhou espaço e o carácter do adultério como figura meramente jurídica deu lugar ao conceito de traição à fidelidade e ao amor monogâmico salvaguardados pelo casamento.

Cada vez mais o casamento é a formalização de relações de afecto em que os cônjuges se casam para salvaguardar os seus direitos sucessórios e de sobrevivência, mais difíceis de salvaguardar no quadro de outro tipo de relações menos institucionais (uniões de facto).

È difícil prever o futuro dos conceitos, das instituições ou das formas de união.

È no entanto seguro que os modelos de família e dos conceitos que lhe estão associados devem modificar-se na medida em que a realidade social se modifica. Citando Engels, "a família é produto do sistema social e reflectirá o estado de cultura desse sistema."

A figura da família biparental convive com a família mono parental, homossexual e novos esquemas de família com os meus, os teus e os nossos filhos.

Tudo se reequaciona. Somos fiéis a nós próprios, nada mais.

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